— Sabe, César — disse-me Afonso — o caso de Ícaro é bem singular. Não temos muitos iguais, aqui na Colônia. O Recanto cuida de planejamentos reencarnatórios na maioria das vezes em longo prazo. Como o caso de Ícaro exigia certa urgência, e, claro, pela bondade divina assim nos foi permitido atuar, nosso irmão não pôde, como de praxe, acompanhar aqueles que serão seus pais. Assim sendo, o período de gestação de Rafaela será bem turbulento, pois Ícaro manifestará fortemente os seus sentimentos.
Chegamos à porta do aposento a mim designado e Afonso despediu-se dizendo:
— Pois bem, amigo: descanse um pouco e ao nascer do sol virei aqui para seguirmos juntos ao Centro de Estudos a fim de assistirmos aos vídeos gravados pela equipe de ligação. Certamente, obteremos grande aprendizado.
—Combinado, Afonso. Estarei esperando e obrigado pelo trabalho de hoje e pelos esclarecimentos que acabou de me passar.
— Sou eu que agradeço meu caro, pela sua disposição em nos ajudar.
Já em meu quarto, tomei um banho, pois ainda sentia-me carecido dos hábitos higiênicos adquiridos na Terra. Logo após, deitei-me e despendi bom tempo visualizando o teto, como que buscando lembranças das imagens que havia tido há pouco, durante a viagem de retorno ao centro da Colônia.
Comecei a penetrar nas imagens familiares que me vieram à mente: visualizei-me em uma mesa de jantar, porém, eu não possuía este meu aspecto físico atual, e a julgar pelo meu vestuário e os dos demais convivas que ali estavam, conclui que a cena ocorria no século XIX. À mesa, além de mim, figuravam-se quatro pessoas, sendo uma delas uma criança, à qual logo identifiquei como sendo Ícaro, pois já o havia visto naquela composição física, em outra ocasião.
Pensando melhor naquelas imagens, de pronto percebi tratar-se de lembranças de outra vida e fiz um esforço maior para me concentrar, a fim de recordar o máximo de eventos possíveis.
Àquela mesa, conversávamos algo sobre seminário. Alguém dentre nós pleiteava seguir a vocação sacerdotal católica, o que parecia despertar grande contentamento em todos ali. Não demorou muito para eu perceber que aquela havia sido a minha família e que eu era quem estava para seguir a ordem eclesiástica. Lembrei-me também de que o patriarca da casa, sentado à ponta da mesa, referiu-se à jovem que estava ao seu lado, chamando-a de Clarice. Imediatamente, deduzi que esta se tratava da mesma entidade que outrora havia sido minha mãezinha no meu último estágio na dimensão terrena, e compreendi a razão de os amigos aqui na Colônia a chamarem pelo referido nome.
À medida que eu me esforçava para recobrar as lembranças, as imagens iam sendo representadas cada vez mais vívidas em mim. Desse modo, conclui que o outro rapaz, que se sentava ao meu lado, era Álvaro — que agora vive como Hélio. Entretanto, para mim, ficou somente a dúvida de quem era o patriarca, pois não percebia nele qualquer ligação com pessoas que eu tivesse conhecido aqui no Recanto.
Não conseguindo alcançar mais informações, resolvi dormir um pouco e guardar os questionamentos para o dia seguinte.
Levantei-me antes da aurora. Enquanto Afonso não chegava, detive-me em apreciar a fuga dos primeiros raios da estrela-mãe de nosso planeta. Matizes desprendiam-se daquela fonte de luz e calor. Era-me possível identificar cada minúcia daquele esplendoroso evento, à medida que cada minúscula centelha chocava-se com a atmosfera ambiente. Eu não poderia ser testemunha de algo mais sublime naquela hora. Era como ver o próprio Criador tocando-nos com suas bênçãos. Mirei o alto e simplesmente agradeci por tudo aquilo.
— Lindo, não é mesmo? — disse Afonso, entrando no meu quarto e cessando minha solitária apreciação.
—Não tenho palavras… — confessei, emocionado.
— Sei bem o que sente meu amigo. A vontade que temos é a de permanecer nessa contemplação interminavelmente…
— Exatamente! — concordei.
Afonso, todavia, propôs:
— Entretanto, se quisermos fazer mais do que admirar a obra divina, imperioso é que façamos parte dela. Assim, para tanto Ele, Deus, Pai amoroso, nos deu a gloriosa ferramenta do trabalho. Enfim, o amigo está pronto para mais uma jornada prática?
— Certamente. Estou bastante entusiasmado.
Depois, indaguei:
— Miguel nos acompanhará?
— Sim, claro. E penso que ele já esteja à nossa espera.
Seguimos, então, ao Centro de Estudos e dessa vez não entramos pelo salão da biblioteca, mas utilizamos a entrada oposta, que fica imediatamente ao lado do Hospital.
Prontamente encontramos Miguel, que, como sempre, nos saldou com grande sorriso
Adentramos em uma sala ali mesmo no piso térreo. Instalamo-nos em nossas poltronas e, empolgados, esperamos pela palestra que nos esclareceria os trabalhos do dia anterior na casa da Rafaela.
Finalmente, todos que participaram daquelas recentes atividades se encontraram na sala, num número aproximado a cinquenta confrades. Como de praxe, antes do início do estudo, a irmã Madalena sugeriu que nos silenciássemos por alguns instantes a fim de que cada um de nós, de um modo particular, firmasse o pensamento em Deus, em oração íntima.
Durante o tempo em que ficamos em meditação, conversando com Deus, era-nos possível ouvir uma suave melodia, que aos poucos preenchia todo o ambiente. A música conduzia-me o pensamento e eu tinha a certeza de que aquele som provinha diretamente do Pai, pois nada, pelo menos naquele momento, parecia ser mais arrebatador.
Ao final daquela melodia, a irmã Madalena solicitou que o irmão Augusto se apresentasse, com o propósito de conduzir os estudos.
Tomando a palavra, Augusto saudou-nos e iniciou a sua exposição.
— Como sabem irmãos, ontem tivemos um dia deveras assoberbado. Alguns de vocês são estreantes nesse campo de trabalho e nós esperamos que este tenha sido o início de outros tantos. Quero parabenizar a todos pelo bom desempenho nas tarefas a que cada um se dignou realizar, uma vez que este mesmo êxito em nossas atividades proporcionou-nos as primeiras investidas para o enlace de nosso amigo Ícaro àquela que será sua mãe. Reconhecemos que o caso de nosso amigo reencarnante é, no mínimo, interessante para nossos estudos e oferece particularidades que eu mesmo, por mais tempo e experiência que tenha nesse tipo de serviço, não hesitarei em buscar auxílio de irmãos mais gabaritados. Como já nos é conhecido, nossa Colônia tem tratado de vários processos reencarnatórios, entretanto, todos com singular semelhança no que tange ao tempo em que se realizam...
O amigo que falava há tão pouco tempo, já nos encantava com tanta doçura e com sua presteza em nos trazer ao conhecimento, os pormenores daquele processo reencarnatório, então, fez uma breve pausa, lançando-se para um lado da sala, e, acionando um aparelho, fez com que à nossa frente aparecesse uma tela holográfica. Feito isso, Augusto continuou seus apontamentos.
— Sendo assim, meus irmãos, venho aqui mostrar a vocês o material que nossas câmeras têm registrado durante algum tempo.
Posicionando a mão direita à frente da tela, Augusto fez um movimento como que se arrastasse algo, e, logo após, nos foi possível ver a imagem da casa de Rafaela.
A palestra nem havia começado e eu já estava empolgadíssimo com aquilo tudo que se apresentava. A reprodução da tela revelava-nos toda a interação entre os dois planos existentes naquele local. Não me demorei nas observações naquela hora, pois Augusto retomava a sua palestra.
PRIMEIRA PARTE (Médium Wilton Oliver) Capítulo 1 - Visitas à casa do irmão Hélio
Cap. 5 - Na câmara de miniaturização
Cap. 6 - Preparação para o porvir
Cap. 8 - Oportunidade para recomeço
Cap. 12 - Nos campos da Colônia
Cap. 14 - Influências nefastas
Cap. 15 - Exposição esclarecedora
SEGUNDA PARTE (Médium Rodrigo Felix da Cruz) - Cap. 1 - Notícia feliz
Cap. 4 - Estágio no Hospital Irmã Margarida
Cap. 7 - Laboratório da Memória
Cap. 9 - Primeiras atividades socorristas
Cap. 10 - Visita a François Dupont
Cap. 12 - Grupo de planejamento
Cap. 13 - Implantação do projeto
Cap. 14 - Trabalho em conjunto
Cap. 15 - Comprometimento, esperança e perdão
TERCEIRA PARTE (médiuns Alessandra Aparecida Silva e Rodrigo Felix da Cruz) Cap. 1 - Balanço
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