Do dia em que trouxemos Ícaro à Colônia até aquela visita à casa de Hélio, passaram-se aproximadamente dois meses.
Ícaro continuava em profundo sono, e como fora dito por Miguel, ele continuava a receber instruções e a tomar conhecimentos para sua nova estadia no plano físico. Aos poucos, Ícaro adquiria uma nova forma física e perispiritual. Seus traços foram ficando cada vez mais jovens, era o chamado processo de miniaturização que André Luiz noticiou em seus livros.
Tive a oportunidade de lhe falar várias vezes em seus sonhos — porque era assim que nos comunicávamos. E eu, instruído por nossos amigos, ia estreitando os laços com Ícaro, ganhando sua confiança e o seu perdão.
Em uma dessas conversas, falamos dos planos para o futuro, e Ícaro, agora se mostrando mais receptivo, declarou o medo que sentia, porque ainda alimentava o desejo de vingança; além disso, muito embora não sabendo explicar, sentia-se desejoso de justiça — leia-se, vingança. Declarava que Deus era ingrato, por não punir a seu contento, tanto o Hélio quanto a mim.
Falei-lhe do progresso que ele já estava tendo e que ele não deixasse aquele sentimento derrubar tudo que havia conquistado até o momento.
— Não pretendo ser hipócrita! Não sinto por você ou por Hélio a menor simpatia — disse-me ele, mas não mostrava raiva em suas palavras, somente um desabafo sincero.
— Entendo quão difícil é o perdão, meu irmão, mas também tenho fé em nosso Pai criador, que o tempo de nos perdoarmos está próximo.
— Você sabe: o que vocês estão fazendo é contra a minha vontade, não é?
— Mas é necessário. Nem sempre a nossa vontade está de acordo com as nossas necessidades de evolução.
— E o tal de livre-arbítrio, onde fica? — perguntou-me Ícaro.
— Nossa capacidade de escolhermos isso ou aquilo está em função do conhecimento que temos do todo. Seria impossível mensurar a utilidade de algo que desconhecemos! Você seria capaz de me dizer qual a utilidade do som para quem não ouve, ou a utilidade da luz para quem a ignora?
— Você sempre com respostas recheadas de analogias e comparações que pretensiosamente esperam concluir o assunto, quando na verdade, vocês não são nada objetivos. Mas chega desse assunto! Enquanto vocês estudam e decidem por mim, eu analiso o melhor jeito de sair daqui.
Naquele instante percebi que Ícaro não tinha conhecimento de que dormia, ele tinha a real impressão de estar preso, em um lugar que, apesar de belo e confortável, ele não desejava nele estar.
Resolvi então deixá-lo para não excitar seu estresse.
— Devo ir, meu irmão. Logo voltarei para conversarmos mais.
Assim eu saí. Exclamei minha despedida, no que Ícaro me disse:
— Falei que não sentia a menor simpatia por Hélio e por você, mas não pense que sinto raiva. Talvez se você tivesse vivido o que eu vivi neste longo tempo, entenderia o que se passa comigo, e aí saberia que para o cego a luz tem alguma importância, diferente do que aqueles que enxergam supõem, pois estes sim ignoram a importância da luz, assim como os culpados ignoram o peso da injustiça para as vítimas.
Calei-me. Novamente me despedi, mas desta vez profundamente tocado por aquelas palavras, proferidas por Ícaro, que minha opinião estava espiritualmente doente, e para minha surpresa apresentava manifestações de inteligência e racionalidade.
*
Os dias se passavam e cada vez mais Ícaro persistia em seus intentos de sair do hospital onde recebia ajuda. Ele, claro, tinha conhecimento de que logo voltaria à vida física na terra, mas lutava de forma angustiante contra isso.
A cada nova visita que lhe fazia, eu podia perceber que sua forma perispiritual ia tomando lentamente as dimensões de uma criança.
Acompanhei todo o processo de mutação que se deu com Ícaro e, sempre que possível, mantinha longos diálogos com ele, sempre com a sublime missão de mostrar-lhe que esta sua nova existência seria para ele uma oportunidade de se livrar de suas mágoas e de todo e qualquer sentimento inferior que ainda pudesse guardar em relação a mim e a Hélio.
PRIMEIRA PARTE (Médium Wilton Oliver) Capítulo 1 - Visitas à casa do irmão Hélio
Cap. 5 - Na câmara de miniaturização
Cap. 6 - Preparação para o porvir
Cap. 8 - Oportunidade para recomeço
Cap. 12 - Nos campos da Colônia
Cap. 14 - Influências nefastas
Cap. 15 - Exposição esclarecedora
SEGUNDA PARTE (Médium Rodrigo Felix da Cruz) - Cap. 1 - Notícia feliz
Cap. 4 - Estágio no Hospital Irmã Margarida
Cap. 7 - Laboratório da Memória
Cap. 9 - Primeiras atividades socorristas
Cap. 10 - Visita a François Dupont
Cap. 12 - Grupo de planejamento
Cap. 13 - Implantação do projeto
Cap. 14 - Trabalho em conjunto
Cap. 15 - Comprometimento, esperança e perdão
TERCEIRA PARTE (médiuns Alessandra Aparecida Silva e Rodrigo Felix da Cruz) Cap. 1 - Balanço
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