Andrew Jackson Davis (Blooming Grove, EUA, 11 de agosto de 1826 - Watertown, EUA, 13 de janeiro de 1910) foi um célebre médium clarividente americano, um dos precursores do movimento Espiritualismo Moderno, pelo que é conhecido como o “Profeta da Nova Revelação”, indiretamente contribuindo para o surgimento do Espiritismo. Era dotado de uma fantástica mediunidade e de suas experiencias espirituais redigiu importantes livros que influenciaram gerações; destas obras, destaca-se The Principles of Nature, Her Divine Revelations, and a Voice to Mankind [Os Princípios da Natureza, Suas Divinas Revelações e a Voz da Humanidade], de 1847, um clássico da literatura espiritualistas mundial.
Andrew Jackson Davis (1826-1910)
Davis nasceu em uma família humilde instalada num vilarejo no interior do Estado de Nova Iorque, às margens do rio Hudson. Seu pai trabalhava com couros, mas não tinha emprego fixo e ainda sofria com o alcoolismo; por outro lado, sua mãe era religiosa e escrupulosa. No seu livro The Magic Staff: an Autobiography [A Vara Mágica: uma Autobiografia], Davis conta detalhes de sua infância e da vida daquele povo analfabeto, embora instintivamente devotado às coisas espirituais. Naquelas cercanias se desenvolveram a religião dos Mórmons e o Espiritualismo Moderno, de que Davis seria um precursor.
Nesse ambiente pobre e rude, Davis crescia sem muitas expectativas quanto ao futuro; além disso, os problemas financeiros faziam com que a família mudasse constantemente de cidade, impedindo o garoto de frequentar a escola com regularidade. Como um meio de obter uma renda para a família e para si, desde cedo encaminhou-se para o ofício de sapateiro; tudo lhe parecia desfavorável.
De fato, aquela alma estava predestinada a desempenhar um papel incrivelmente ímpar; mas da primeira fase da sua vida, a coisa mais curiosa que havia visto — mesmo que sem compreender bem — tinha sido uma palestra sobre o Mesmerismo, como técnica de terapia para diversas enfermidades, isso em 1843, quando Andrew tinha só dezessete anos. Fortemente impressionado, ele até fez experimentos com as tais técnicas magnéticas, porém não obteve qualquer resultado prático. Não de pronto, na verdade.
Ainda na mocidade começou a ouvir vozes espirituais, em geral, gentis e aconselhadoras. Em seguida à clariaudiência nele desabrochou a vidência especial: por ocasião da morte de sua mãe, teve uma notável visão de uma casa muito amável, numa região brilhante, que imaginou ser o lugar para onde sua progenitora tinha ido. Davis, porém, nada compreendia daqueles fenômenos que lhe envolviam.
Entretanto, pouco dias depois daquela curiosa palestra sobre Magnetismo, seu vilarejo foi visitado por um saltimbanco que exibia “as maravilhas” daquela nova ciência; ele fez uma despretensiosa experiência com Davis, em meio a outros jovens da sua turma, e eis que um notável poder de clarividência então se descortinou ante os olhos daquele rapaz — muito embora o magnetista brincalhão itinerante nem sequer se deu conta disso. Mas a facilidade do jovem aprendiz de sapateiro de entrar em transe chamou a atenção de um vizinho seu, já iniciado na leitura do sonambulismo induzido.
Este vizinho — Wiliam Livingstone, alfaiate bem conhecido na região — convidou o jovem Davis para algumas experimentações, das quais eles progressivamente conseguiram espantosos êxitos; uma vez magnetizado, a visão espiritual do rapaz desabrochava a tal ponto de ele conseguir fazer uma leitura muito minuciosa e precisa do estado de saúde de qualquer pessoa, identificando órgãos danificados e caracterizados pelo espectro escuro projetado no seu corpo fluídico (perispírito) que os olhos espirituais de Davis escaneavam enquanto em transe, mas que esquecia ao retomar o estado de vigília; em alguns casos, além de diagnosticar, o clarividente prescrevia tratamentos, cujas testemunhas alegaram sucesso. Com isso, a alfaiataria daria lugar a um consultório.
A cada novo desdobramento espiritual Davis desenvolvia uma melhor compreensão sobre tudo o que lhe passava com ele, mas ainda nada muito excepcional. Todavia, na tarde de 6 de março de 1844, ele afirmou ter sido inesperadamente envolvido por uma força que o fez levitar e o teria arrebatado em uma rápida jornada, num estado de semitranse, de Poughkeepsie, onde morava, até às montanhas Catskill, distantes dali 60 quilômetros. Nesta montanha, Davis teve contato com dois anciões, que ele identificou como sendo o filósofo e médico grego Cláudio Galeno e o célebre espiritualista sueco Emanuel Swedenborg; estes lhe ministraram conhecimentos diversos, mas especialmente em medicina e filosofia moral — experiência tal que lhe possibilitou uma extraordinária iluminação intelectual.
Estava evidente que Davis era mais um profeta predestinado a acrescentar algumas linhas ao livro das revelações espirituais, e conquanto ele não fizesse ideia de como isso poderia acontecer, o plano — ou missão — de escrever um livro sobre suas incursões anímicas parecia cada vez mais patente. Verificou então maiores forças a se agitarem em si mesmo, fora do alcance da competência magnética do Sr. Livingston, e então Davis recorreu à sustentação de um novo magnetizador, mais experiente. Foi quando se lhe apresentou o Dr. Lyon, com quem o clarividente foi para Nova Iorque a fim de trabalhar suas potencialidades psíquicas; já para o projeto do livro, ambos procuraram o reverendo William Fishbough para servir de secretário.
Pouco tempo depois Davis desenvolveu por si mesmo a capacidade de entrar em transe, sem auxílio de indução magnética de terceiros; no entanto, a parceira com o Dr. Lyon e o reverendo continuaram. Numa sincronia de intentos, os três buscavam conhecer os segredos da natureza espiritual. Nesse ínterim, sua memória subconsciente se abriu e ele pôde abarcar o largo alcance de suas experiências. Em 1846, Davis com apenas vinte anos de idade, começou a ditar um livro baseado nessas revelações durante um período de quinze meses. O livro foi publicado no ano seguinte, contendo os mais diversos assuntos, em alto teor filosófico: os sete planos da existência, saúde mental e física, astronomia, física, química, política, dentre outros. Os ditados, compilados pelo Reverendo Fishbough, deram origem ao primeiro livro de Andrew Jackson Davis: The Principles of Nature, Her Divine Revelations, and a Voice to Mankind (Os Princípios da Natureza, Suas Divinas Revelações e uma Voz para a Humanidade).
Sábios e estudiosos de todas as vertentes vieram conferir os experimentos com Davis e alguns o comparavam a Swedenborg.
Arthur Conan Doyle (médico e escritor, criador do famoso personagem Sherlock Holmes) distinguiu os valores de cada qual:
O “milagre” era estrondosamente intrigante. Depois de assistir uma sessão com Davis, Dr. George Bush (professor de Hebraico da Universidade de Nova Iorque) testemunhou:
O famoso escritor Edgar Allan Poe o visitou muitas vezes e nele se inspirou para compor seus contos. Admirava-se com as “ideias futuristas de Davis” que havia previsto a invenção do automóvel e de veículos aéreos acionados por uma força motriz de natureza explosiva, as máquinas de escrever e locomotivas movidas por motores de combustão interna.
Suas revelações inspiraram o surgimento da revista Univercælum, cuja primeira edição saiu em dezembro de 1847, anunciando seu propósito básico: “O estabelecimento de um sistema universal da verdade, da reforma e reorganização da sociedade”, redigido pelo reverendo S. B. Brittan, que se apresentou como ministro universalista. Nos números seguintes, próprio Andrew Jackson Davis iria contribuir com alguns artigos para esta revista.
No seu livro Os Princípios da Natureza, Andrew Jackson Davis previu o surgimento do movimento que abalaria o século XIX: o Espiritualismo Moderno; ele predisse a manifestação ostensiva dos Espíritos com as criaturas humanas, adiantando que o advento desses dias não estava muito distante.
Foi um prelúdio daquilo que surgiria um ano mais tarde, em 31 de março de 1848, quando se estabeleceu um sistema de intercâmbio com o plano espiritual, através das médiuns irmãs Fox, no famoso caso de Hydesville, considerado o marco do Espiritualismo Moderno. Para aquele exato dia, consta no diário de Davis a seguinte nota:
Davis antecipou as ideias primordiais que mais tarde seriam fundamentadas pela codificação do Espiritismo através de Allan Kardec. Conan Doyle sintetiza as visões do profeta americano, que tinham uma correspondência muito próxima com aquelas revelações espirituais apresentadas por Emanuel Swedenborg, um século antes: “Ele viu uma vida semelhante à da Terra, uma vida que pode ser chamada semimaterial, com prazeres e objetivos adequados à nossa natureza, que de modo algum se havia transformado pela morte. Viu estudo para os estudiosos, tarefas geniais para os enérgicos, arte para os artistas, beleza para os amantes da Natureza, repouso para os cansados. Viu fases graduadas da vida espiritual, através das quais lentamente se sobe para o sublime e para o celestial.”
Nas visões do jovem clarividente, tudo no Universo era ordem e magnificência divina, obedecendo ao influxo de uma constante renovação em que “uma evolução mais alta surgiria e onde uma classe mais alta se iniciaria do mesmo modo que algures a classe mais baixa”, num processo que envolvia “trilhões de anos e sempre trabalhando no sentido do refinamento e da purificação”. Para ele, o objetivo da vida consiste em promover esse processo e o melhor método para o progresso humano é “livrar-se do pecado — não só dos pecados geralmente reconhecidos, mas também dos pecados do fanatismo, da estreiteza de vistas e da dureza, que são manchas especiais, não só na efêmera vida carnal, mas na permanente vida do espírito.” Nesse contexto, ele pregava que “o dinheiro, o álcool, a luxúria, a violência e o sacerdócio — no seu limitado sentido — constituem os maiores empecilhos do progresso humano.”
Depois de toda a repercussão de sua obra, Davis só queria uma vida comum — o que, enfim, ele conseguiria um pouco mais tarde; antes, porém, ele iria passar por alguns relacionamentos conturbados. Primeiro, em 1848, envolveu-se com Catherine De Wolf, que era casada e vinte anos a mais que o inexperiente visionário; no mesmo ano, ela se separou do marido, conseguiu a carta de divórcio e se casou com seu amante médium. Eles desfrutaram desse matrimônio por cinco anos; adoentada, ela faleceu em 1853; não obstante, Davis afirmou que continuava a se encontrar espiritualmente com Catherine.
Seu segundo casamento se deu de forma bem parecida: passado um ano na viuvez, Davis proferia uma palestra em Clarendon, Nova Iorque, estando na plateia a Sra. Mary Fenn Love; ela apaixonou-se perdidamente pelo palestrante e em um ano eles estavam casados. Passados trinta anos (1885), eles se divorciaram a pedido dele, que supostamente já mantinha relações com Delphine Markham, com quem o profeta se casou no mesmo ano em que se separara de Mary. Davis e Delphine foram morar em Boston, onde ele finalmente estabeleceu uma “vida comum”, administrando uma livraria.
Nesse ínterim, ele publicou mais duas obras literárias: The Philosophy of Special Providences [A Filosofia das Providências Especiais], de 1850, e The Great Harmonia [A Grande Harmonia], finalizado em 1861. Além disso, em 1883 ele foi agraciado com o título de Doctor Honoris Causa em Antropologia pela US Medical College.
Apesar de ser admirado por conservar o mesmo espírito de humildade, bondade e desprendimento material, Davis não deixou de ser duramente atacado pelo discurso de religiosos conservadores, que viram em seus dons mediúnicos um misticismo satânico. A tais críticas, ele respondia com um sorriso tolerante. Com o surgimento do Espiritualismo Moderno, quando outros tantos médiuns vieram figurar os salões nobres com as sessões de Mesas Girantes e outros espetáculos, Davis se viu justificado, pois enfim — como previra — não estava só naquele terreno hostil desafiando crenças tradicionais.
Andrew Jackson Davis
Sua autobiografia The Magic Staff [A Vara Mágina] obviamente só registra sua obra mediúnica até a data de sua publicação, em 1857, quando ainda estava na faixa dos trinta anos; daí até os seus últimos dias — tendo morrido aos oitenta e quatro anos —, viveu dignamente trabalhando na mesma livraria em Boston, alternando entre a leitura e a escrita, além da prescrição de ervas para os pacientes que o procuravam. Ainda nesse meio tempo, ele compôs mais três livros: A Stellar Key to the Summer Land [Uma Chave Estelar para o Reino do Verão] em 1868, The Philosophy Of Spiritual Intercourse [A Filosofia da Relação Espiritual] de 1872 e Views of Our Heavenly Home [Visões de Nossa Casa Celestial] em 1878, que, todavia, não tiveram a mesma repercussão das obras anteriores.
Davis morreu em Watertown, Massachusetts, em 13 de janeiro de 1910, aos oitenta e quatro anos. Arthur Conan Doyle resumiu sua personalidade nestes termos:
Andrew Jackson Davis foi uma grande inspiração para a geração de médiuns que plantaram as sementes da revelação espiritual moderna no terreno que ele havia arado com os desafios típicos da vanguarda. Sobre seus dons e sua relação com a espiritualidade, aliás, ele dissertou:
Para codificar o Espiritismo, Allan Kardec valeu-se do legado deixado por Davis e o considerou como um grande contributo para a formação da Terceira Revelação. Na Revista Espírita de abril de 1862, o codificador indicou a leitura de uma biografia, publicada por Clémence Guérin, sobre aquele a quem chamou de “um dos principais escritores espiritualistas dos Estados Unidos”.
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