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Índice de verbetes


União ESpírita Francesa



União Espírita Francesa (Union Spirite Française), às vezes designada pela sigla UEF, foi um grupo de estudos e divulgação do Espiritismo fundado em 24 de dezembro de 1882, em Paris, França, com o objetivo de servir de entidade federativa para os espíritas locais e intercâmbio com outros centros espíritas do exterior, em continuidade às obras doutrinárias de Allan Kardec e total observância aos princípios da codificação do Espiritismo. Sua fundação também teve como pano de fundo a circunstância de fazer frente à Sociedade Anônima, entidade que herdou os bens deixados por Kardec (Revista Espírita, Livraria Espírita e direitos autorais dos seus livros doutrinários) e que, no entender da União, estava transviando os valores da doutrina. Seus principais articuladores foram Berthe Fropo, Gabriel Delanne e Léon Denis, com a anuência da viúva Kardec (Amélie Gabrielle Boudet). Seu órgão oficial foi o jornal O Espiritismo (Le Spiritisme), que circulou quinzenalmente entre março de 1883 e janeiro de 1895.


Denis, Fropo e Delanne, fundadores da União Espírita Francesa



Contexto histórico da fundação da União

Após a desencarnação do codificador espírita, foi criada a Sociedade Anônima para a continuação das obras espíritas de Allan Kardec, que herdou legalmente os direitos autorais dos livros doutrinários, a direção da Revista Espírita (que permaneceu sendo publicada mensalmente) e da Livraria Espírita. No centro da gestão desses recursos estava Pierre-Gaëtan Leymarie, que havia sido membro e médium da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, dito amigo do casal Kardec e continuador da obra do codificador espírita; Leymarie que, por outro lado, havia se tornado alvo de graves críticas quanto à condução daqueles recursos, especialmente por transviar os conceitos fundamentais da Doutrina Espírita e nela dar abrigo a ideias estranhas, principalmente as do Roustainguismo e as da Teosofia, fora a acusação de um ávido interesse material e usurpação particular dos bens espíritas.

Numa sessão mediúnica realizada na casa da viúva Kardec, em 27 de janeiro de 1881, uma comunicação assinada pelo Espírito Allan Kardec incita a viúva do pioneiro espírita a fundar outra sociedade, uma vez que aqueles que estavam à frente do seu legado haviam se corrompido:

"(...) Não te disse, Amélie, querida companheira de meus trabalhos, que era para o futuro que tinhas que olhar, por ti, por mim, pelo espiritismo? Cabe a ti, portanto, retificar aquilo que, no momento, tem sido manchado de erros. Cabe a ti distinguir os espíritas de uma nova era que têm apenas a lisonja e o interesse por guias, cabe a ti distinguir os espíritas abnegados e devotados à nossa causa desde há muito, que, chamados a continuar a fazer frutificar o que eu semeei, devem, tão logo o momento de agir lhes seja indicado, formar uma sociedade nova chamada a elaborar a continuação das minhas obras. Os membros que devem compô-la já estão escolhidos por nós; eles devem, sob os meus auspícios e os teus, cumprir a nossa missão e a deles.
“(...) Um pouco mais tarde, dar-te-ei uma comunicação mais precisa acerca da sociedade existente, e, enquanto deixo o teu livre-arbítrio, descrever-te-ei o papel que a nova sociedade deve cumprir, que em breve chegará ao ponto que lhe está designada” (Allan Kardec, Espírito)."
Muita Luz (Beaucoup de Lumière), Berthe Fropo - "Histórico da União"

Noutra comunicação, recebida na mesma ocasião, o mesmo Espírito Kardec dirige-se a mais uma das pessoas presentes naquela sessão, dando instruções para a nova sociedade: Berthe Fropo, amiga intima do casal Kardec e também confrade dele na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas. Fropo já havia recebido uma mensagem indicando que ela estaria à frente de uma nova sociedade espírita e de um jornal que seria fundado por esta entidade, e que estas obras teriam grande influência sobre o futuro da doutrina. Até então, Fropo não havia dado qualquer importância a essa previsão, que ela considerava genérica; agora, porém, as especificações mereciam melhor atenção:

“(...) Como vos foi dito, vós estareis dentre os Espíritos missionários que têm uma grande tarefa a cumprir. Em breve eles irão iniciá-la e vereis então o rápido desenvolvimento de nossas ideias.
“Uma sociedade nova está em formação; os Espíritos terrestres estão escolhidos; a qualquer momento eles se farão conhecidos a vós, e como vós já são velhos amigos de precedentes existências, vós vos entendereis perfeitamente; vós sereis um dos nossos bons médiuns: surgir-vos-ão diversas faculdades novas, assim que vossa saúde for restaurada por bons fluidos, como vos foi dito. Pertencereis a um grupo escolhido, pelo qual os Espíritos superiores poderão verdadeiramente se comunicar sem ter que lutar contra os Espíritos recalcitrantes. Vós assistireis e ajudareis o desenvolvimento de vossa sociedade, que marchará a passo de gigante...”
Idem

Seguiram-se outras comunicações mediúnicas dirigidas à viúva Kardec e à família Delanne no intuito de instigá-los a fundar uma nova sociedade. Numa delas, o Espírito Kardec havia salientado:

"(...) É dever de todo espírita sincero evitar que a doutrina seja desviada de seu verdadeiro curso; portanto, meus amigos, eu conto convosco. Sei o quanto amais nossa querida filosofia e o quanto desejais vê-la triunfar; eis porque vos disse essas coisas; são conselhos de amigo que vos dou, sabendo que vos agradarei, e que vós vos esforçareis para trabalhar pela obra de regeneração à qual me devotei, Sublime missão que é a de ensinar aos seus irmãos o caminho da felicidade que é aquela, como dizia o Cristo, ‘da vida eterna’..."
Idem

Apesar das insistentes comunicações, por quase dois anos, nem o Sr. Delanne nem Amélie Boudet efetivaram a ideia. Ele, devido sua intensa ocupação com a sua profissão (mercador viajante); ela, tanto pela incapacidade física (em razão da idade avançada) quanto pelo constrangimento de ter que confrontar a mesma sociedade a que havia ajudado a fundar com o esposo. Um momento se deu em que, muito pelo entusiasmo de Berthe Fropo, eles reuniram um seleto grupo e deliberaram levar a efeito o pedido de Kardec.

"Ficou estabelecido que nós faríamos um apelo a todos os espíritas sinceros, elaboraríamos o estatuto e que a sociedade receberia o título de União Espírita Francesa.
“Alguns espíritas ficaram alarmados com esta decisão, e, temendo ver a antiga sociedade ruir, protestaram; outros, ao contrário, vendo que depois da morte do Mestre, o espiritismo definhava e perdia espaço, acolheu com entusiasmo a possibilidade de fundar uma nova sociedade e um jornal acessível."
Idem


A oficialização da nova entidade

Uma primeira reunião de espíritas interessados em fundar uma nova entidade do tipo federativa ocorreu em 4 de setembro de 1882, na sede da Sociedade Anônima (Rua Petit-Champs, 5, centro de Paris), motivada por proposições vinda de confrades belgas. O próprio Leymarie tinha se comprometido em participar das negociações para a instauração da futura União, inclusive oferecendo a mesma sede da Sociedade Anônima para uso de um comitê que seria formado para articular aderentes e estudar um projeto do estatuto da nova entidade. Tudo arranjado, o comitê passaria a se reunir ali regularmente, aos domingos e quartas-feiras. Ficou acertado ainda que a assembleia geral para apreciação dos trabalhos do comitê seria realizada em 19 de novembro daquele 1882, naquele referido endereço.


Lista dos membros do comitê fundador da UEF


Era o presidente do comitê o Dr. Josset, sendo seus secretários os senhores Camille Chaigneau e Gabriel Delanne. Parecia tudo bem encaminhado, até surgir um desacordo grave já no segundo encontro do comitê, em 22 de setembro:

"A comissão ia continuar seus trabalhos, quando um de seus membros, o Senhor Vautier, declarou que sendo administrador da Sociedade anônima para a continuação das obras de Allan Kardec, ele não podia admitir que, no local dessa sociedade, fosse questão de fundar um novo jornal espírita, pois dizia ele, seria prejudicar os interesses da Revista Espírita."
Fundação da União Espírita Francesa, UEF - "As origens da UEF"

Criada a cisão insolúvel, o comitê deixou a sede da Sociedade e continuou os seus trabalhos numa residência, oferecida por um dos membros. Por fim, o relatório da comissão e o esboço do estatuto da União foram apresentados à assembleia geral no dia 24 de dezembro seguinte, num salão na Rua Jean Jacques Rousseau, 35, Paris, sendo aprovados e assinados por mais de quatrocentos confrades espíritas.

Na sessão inaugural, Alexandre Delanne (pai de Gabriel Delanne) fez o primeiro discurso, no qual observou o prejuízo para o movimento espírita após a partida de seu fundador, Allan Kardec, frente às dificuldades então apresentadas, justificando assim aquela nova fundação:

"Para remediar tal estado de coisas, acreditamos que é indispensável nos agrupar de novo nossos esforços, de alguma sorte; marchando em filas fechadas, sob uma direção inteligente e ativa, que se pode cumprir grandes coisas. O isolamento, é a fraqueza; não permaneçamos por isso sozinhos conosco mesmos, formemos uma vasta associação que permitirá a todas nossas energias achar seu lugar útil, em uma palavra façamos a União Espírita Francesa."
Alexandre Delanne - Idem


O estatuto

O estatuto apresentado pelo comitê, e aprovado pela assembleia fundadora da União, principia-se com o Título I: “A fim de dar um novo impulso ao espiritismo na França, certo número de espíritas e chefes de grupos de Paris se reuniram e formaram um comitê de iniciativa para organizar a União Espírita Francesa.” O artigo primeiro do Título II destaca os objetivos da entidade:

"A união tem por objetivo o agrupamento de espíritas franceses, o estudo de todos os fenômenos espíritas, e a propagação da filosofia e da moral do espiritismo por todos os meios que as leis autorizam, e principalmente pela publicação de um jornal bimensal tendo por título: O Espiritismo, órgão da União Espírita Francesa.
Idem - “Estatuto para UEF e a fundação do jornal”

Algumas definições estatutárias da UEF contidas no seu estatuto:

  • Sede estabelecida na Galeria de Valois, 167, no Palais Royal;
  • Reuniões toda primeira sexta-feira do mês, às 20h;
  • Proibição de questões políticas e controvérsias religiosas;
  • Todos os titulares, homens ou mulheres, são elegíveis a todas as funções que são eletivas e absolutamente voluntárias, sem remuneração;
  • A União será administrada por um comitê central de pelo menos trinta membros nomeados pela assembleia geral. Um presidente titular será encarregado de representar a União nas relações com a autoridade.
  • A cada sessão, o comitê escolherá seu presidente entre os membros.


O jornal da União

Na mesma sessão inaugural da União, Alexandre Delanne explanou as necessidades de a União ter o seu jornal próprio — O Espiritismo (Le Spiritisme) —, a ser vendido a preço popular, cuja disposição primordial ele expôs da seguinte forma:

"Teremos por missão combater o materialismo, que é o mais terrível dissolvente da sociedade. É preciso nos dedicarmos em divulgar nossas ideias em todas as classes e particularmente nas dos trabalhadores. É preciso demonstrar-lhes que nós somos realmente irmãos, que a situação deles, frequentemente penosa, é só temporária, e que, submetendo-se à Lei do trabalho, que enobrece seus filhos, eles crescem moralmente, e poderão mais tarde adquirir uma posição mais feliz."
Alexandre Delanne - Idem

Enfatizando essa disposição, o filósofo espírita Léon Denis discursou perante os cofundadores da União:

"Todas as questões materiais devem se apagar diante da grandeza dos Interesses que defendemos. Abracemo-nos, apoiemo-nos uns nos outros, fundemos uma obra de fraternidade, uma obra que agrupe em um feixe nossas forças, nossos meios e ação, que os faça convergir em direção a esse objetivo elevado, em direção desse objeto constante de nossa solicitude, de nossas meditações: o Progresso moral, a Regeneração da humanidade."
Léon Denis - Idem

O periódico seria lançado quinzenalmente, contendo oito páginas, ao custo de 4 francos a assinatura anual e inicialmente subsidiado pelo donativo de 50 francos de cada membro da União. A sua primeira edição veio à lume na primeira quinzena de março de 1883 e sua publicação permaneceu ininterrupta por cerca de 12 anos, sendo o último volume distribuído em janeiro de 1895.


1ª edição de Le Spiritisme (O Espiritismo)


Entre os artigos de maior repercussão do jornal, destacamos dois, os quais determinaram novos rumos para a história do Espiritismo.

No primeiro temos a primeira voz a se levantar publicamente contra os ditos desvios doutrinários de Pierre-Gaëtan Leymarie, mandatário da Sociedade Espírita para a Continuação das Obras Espíritas de Allan Kardec: Berthe Fropo, em um artigo intitulado “Um pouco de luz” (Um peut de lumière), denuncia o descaso com que a Sociedade Anônima e a Revista Espírita dirigida por aquela entidade vinha fazendo em relação ao nome e memória do codificador do Espiritismo.

"Eu também perguntaria à Sociedade por que decidiu por unanimidade, em uma assembleia geral, que o antigo título "Sociedade para a continuação das obras espíritas de Allan Kardec" fosse renomeado no futuro para Sociedade Científica do Espiritismo. Por que essa evolução? O que se pretendia fazer, removendo o nome do fundador, o mestre que vocês diziam ser tão respeitado e tão venerado. Em nome de todos os meus irmãos de crença, venho pedir-lhe o motivo; essa evolução é muito grave para que não tenhamos a explicação."
Berthe Fropo - O Espiritismo - 2ª quinzena de out. de 1883: "Um pouco de luz"

Da repercussão desse artigo desenrolou-se a obra Beaucoup de Lumiêre, da mesma autora do referido artigo, que cairia no ostracismo do movimento espírita de então, mas que, finalmente, seria resgatada pelo movimento espírita brasileiro a partir da versão traduzida para o português, Muita Luz, lançada em 2017, ajudando assim a recompor os valores históricos esquecidos do Espiritismo pós-Kardec, como retratado no documentário Espiritismo à Francesa: a derrocada do Movimento Espírita Francês pós-Kardec.

Ver Espiritismo à Francesa: a derrocada do movimento espírita francês pós-Kardec.


Muita Luz (Beaucoup de Lumière) de Berthe Fropo


O segundo momento especial do jornal da União viria com a denúncia de Henri Sausse, em seu artigo “Uma infâmia”, de que o conteúdo do livro A Gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo de Allan Kardec teria sido adulterado a partir de uma nova edição (a 5ª), dita “revisada, corrigida e aumentada”, publicada — no entender do denunciante — pela Sociedade Anônima, após a desencarnação de Kardec, supostamente para favorecer ideias roustainguistas.

“Não sei se todas as obras de Allan Kardec foram maculadas por mãos sacrílegas, mas me dei conta de que há pelo menos uma, A Gênese, que sofreu importantes mutilações. Chocado por estas três palavras: Revista, Corrigida e Aumentada, colocadas abaixo da quinta edição, tive a paciência de confrontar, página por página, linha por linha, essa quinta edição com a publicada em 1868 e que eu havia comprado no momento de sua publicação. O resultado de meu trabalho é este. Ao comparar os textos da primeira edição com os da quinta, encontrei que 126 passagens haviam sido modificadas, acrescentadas ou suprimidas. Desse número, 11 foram objeto de uma revisão parcial. 50 foram acrescentadas e 65 suprimidas, sem contar os números dos parágrafos trocados de lugar, nem os títulos que foram acrescentados. Todas as partes desse livro sofreram mutilações graves, em maior ou em menor grau, mas o capítulo XVIII: ‘São chegados os tempos’, é o que foi mais maltratado; as modificações que se produziram nele tornam-no quase irreconhecível. Agora, me direis, quem são os culpados? Qual foi o motivo dessas manobras? Ressaltarei, na primeira edição de A Gênese, somente uma única passagem das que foram suprimidas; será suficiente que a indique para colocar-vos em condições de julgar quem deveria tirar proveito dessa infâmia."
Henri Sausse - O Espiritismo - 1ª quinzena de 1884: “Uma infâmia”

As denúncias tiverem certa repercussão à época, receberam resposta da Sociedade Anônima, depois caíram no esquecimento. Tempos depois, contudo, esse mesmo artigo de Henri Sausse iria servir de base para novas especulações acerca da autenticidade daquela edição revisada do livro A Gênese: a diplomata brasileira e pesquisadora espírita Simoni Goidanich Privato, através de seu livro El Legado de Allan Kardec, lançado em espanhol pela Federación Espiritista Argentina, em 2017, e no ano seguinte lançado em português no Brasil, O Legado de Allan Kardec, encabeçou uma campanha internacional resgatando a denúncia de Henri Sausse, oferecendo novos dados históricos para sustentar a tese de adulteração da aquela edição revisada e aumentada (5ª edição) da referida obra). Esta campanha teve inicialmente grande aceitação, mas foi logo enfraquecida pela descoberta e divulgação de novos elementos históricos, especialmente: o acervo pessoal do Dr. Canuto Abreu, que deu origem ao projeto Cartas de Kardec, da Fundação Espírita André Luiz (FEAL), e mais tarde o Projeto Allan Kardec da Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais; os manuscritos originais de Kardec recuperados pelo Museu Virtual do Espiritismo; as pesquisas contextuais da fanpage CSI do Espiritismo.

Ver a página especial O Caso A Gênese.


Resposta aos Roustainguistas

Em 1883, foi publicada a brochura Os Quatro Evangelhos de J.-B. Roustaing: resposta aos seus críticos e seus adversários, cujos autores ocultaram-se pela designação “Discípulos de Jean-Baptiste Roustaing”, contendo — como “grande novidade” — um artigo inédito atribuído a Jean-Baptiste Roustaing e reservado para ser publicado depois do seu falecimento (ocorrido em 1879) aos cuidados do seu testamentário Jean Guérin; tal texto é uma resposta a uma resenha de Allan Kardec, publicada na Revista Espírita de junho de 1867, pela qual o codificador espírita faz uma pequena resenha do livro Os Quatro Evangelhos de Roustaing; não contente com o que considerou “pouca apreciação” de Kardec para com o seu livro, Roustaing teria registrado em seu artigo severas críticas ao pioneiro espírita. Como se não bastasse, e para a indignação dos kardecistas, a brochura roustainguista estava sendo franqueada pelo órgão que se presumia zelar e dar continuidade ao Espiritismo — a Sociedade Anônima, comandada por Leymarie — e então distribuída como encarte aos assinantes da Revista Espírita.

Vigilante na defesa dos princípios doutrinários e nos valores históricos espíritas, coube à União uma resposta a acusações dirigidas contra a honra de Allan Kardec e contra os conceitos doutrinários da Revelação dos Espíritos. Para tanto, a UEF editou naquele mesmo ano (1833) uma brochura-resposta: J.-B. Roustaing diante do Espiritismo: resposta aos seus discípulos (J.-B. Roustaing devant le Spiritisme Réponse à ses Élèves), onde lemos a revolta dos seguidores de Kardec:

"Esse panfleto, endereçado diretamente a todos nós, vem, mais de catorze anos após a morte de Allan Kardec, e sobre o recém-fechado caixão de sua companheira, visar a honorabilidade do Mestre, a autenticidade de seu método, o valor de seus trabalhos; e juntando a hipocrisia à injúria, protestar maliciosamente estima e admiração pelo homem que esse escrito não cessa de ridicularizar.
"(...) Nós acreditamos que ele seja, com efeito, bastante grande para afogar em sua sombra todos os pigmeus que latem sobre seus calcanhares. Entretanto, não reconhecemos a ninguém o direito de nos impor silêncio, quando tentam sujar sua memória venerada. A seus serões a seus combates, nós devemos nossas mais vivas luzes, nossas mais altas esperanças, um critério soberano para apreciar os elementos do progresso futuro. O mínimo que nossa gratidão pode fazer é oferecer, às verdades que ele nos revela, a muralha de nossas consciências."
Sophie Rosen - J.-B. Roustaing diante do Espiritismo: resposta aos seus discípulos - UEF: “Observeção”


J.-B. Roustaing diante do Espiritismo: resposta aos seus discípulos, da UEF



Declínio da União

Apesar de certo vigor nos seus primeiros anos, as ações da UEF entraram em declínio antes mesmo de completar uma década, pari passu com todo o movimento espírita original francês após o falecimento de Allan Kardec. As reuniões regulares da União deixaram de ser realizadas ainda em 1887, embora o nome permanecesse juntamente com o seu periódico; finalmente em 1891, a entidade foi oficialmente dissolvida, conforme nota do Le Spiritisme:

Seguindo uma convocação geral dos membros da União Espírita Francesa, na quarta-feira, 21 de outubro de 1891, reuniram-se na residência do Sr. Lussan, os Senhores Auzanneau, Bouvery, G. Delanne, Courlet, Viret e as Senhoras Delanne, Rosen e Dieu, que responderam ao chamado, para efeito de deliberar sobre as duas questões seguintes:
DA EXISTÊNCIA DA UNIÃO.
DU JORNAL LE SPIRITISME
Após deliberação, foi aceito por unanimidade que a União Espírita Francesa deveria ser considerada como dissolvida, não havendo existência regular já há quatro anos. Em consequência disso, o jornal Le Spiritisme, a datar deste dia, deixa de ser o órgão da União Espírita Francesa.
Os membros presentes decidem por unanimidade que o jornal Le Spiritisme, passa a ser propriedade do Sr. G. Delanne, que era seu gerente desde sua fundação.
Le Spiritisme - 6° Ano, n° 11, nov. de 1891, p. 167

Delanne mantem a publicação do Le Spiritisme, mas depois o vende, em setembro de 1893, a Arthur D'Anglemont, que por sua vez encarrega Laurent de Faget de gerenciá-lo. Este, muito dedicado aos princípios espíritas, acaba em divergência doutrinária com o proprietário do jornal e deixa seu cargo em 1894 para fundar seu próprio periódico: Le Progrès Spirite (Progresso Espírita). No ano seguinte, D'Anglemont declara o encerramento do Le Spiritisme.


A nova União e a sua extinção

Em 1919, o filantropo espírita Jean Meyer começou a atuar fortemente para a revivescência do Movimento Espírita francês, ao lado especialmente de Gabriel Delanne e Léon Denis. Dentre as primeiras providências estava a de criar uma nova entidade que pudesse reunir os confrades kardecistas em torno de um mesmo conjunto de ações em prol da fomentação do Espiritismo. Esta ideia concretizou-se em 25 de fevereiro daquele ano de 1919 com a fundação da nova União Espírita Francesa — ou, se assim se preferir, a refundação daquela União extinta em 1891 — tendo como sede o endereço de número 11 da Avenida des Tilleuls, na Vila Montmorency, em Paris, lá permanecendo até 1923, quando foi realocada no prédio do número 8 da Rua Copernic, prédio esse que ficaria conhecido como "La Maison des Spirites" ("A Casa dos Espíritas"), que também sediava a Federação Espírita Internacional (Fédération Spirite Internationale) e a Federação Internacional dos Espiritualistas (International Spiritualists Federation). À frente da primeira diretoria, Gabriel Delanne assumiu a presidência; os vice-presidentes eram Léon Chevreuil e Jean Meyer; Léon Denis foi agraciado seu presidente honorário.

Dois anos seguintes ao do seu surgimento, a nova União lançou um novo periódico oficial, o Bulletin de l'Union Spirite Française (Boletim da União Espírita Francesa), cujo subtítulo era "Órgão dos Espíritas da França e das Colônias (Organe des Spirites de France e des Colonies)", publicado mensalmente, sendo sua primeira edição a de janeiro de 1921. Em 1935, a nova diretoria da UEF substitui o nome do seu Boletim para Survie (Sobrevivência), agora com o subtítulo "Organe de l'Union Spirite Française (Órgão da União Espírita Francesa)", passando a vigorar já na edição de janeiro de 1936 e perdurando até 1976.


Maison des Spirites (Casa dos Espíritas), sede da UEF a partir de 1923


Depois do falecimento das principais lideranças espíritas de então (Meyer, Delanne, Denis e Léon Chevreuil), o que restou das atividades institucionais espíritas francesas foram passando de mãos em mãos e se descaracterizando doutrinalmente. Em abril de 1976, sob a administração de André Dumas, de novo a União deixa de existir oficialmente para dar lugar à eclética "União Científica Francofone para a Investigação Psíquica e o Estudo da Sobrevivência da Alma" (Union Scientifique Francophone pour l’Investigation Psychique et l’Etude de la Survivance de l’Ame).


Referências

  • Muita Luz (Beaucoup de Lumière), Berthe Fropo (livro online).
  • Fundação da União Espírita Francesa, União Espírita Francesa (livro online).
  • "A União Espírita Francesa" em Autores Espíritas Clássicos (Site oficial).
  • J.-B. Roustaing diante do Espiritismo, União Espírita Francesa (livro online).
  • Documentário Espiritismo à Francesa: a derrocada do Movimento Espírita Francês pós-Kardec, direção de Ery Lopes; produção Luz Espírita, 2018 (assistir ao filme online).
  • Artigo "Prefácio anti-Kardec publicado pela FEB em 1920" no blog Espiritismo em Movimento (acesso em novembro, 2020).
  • Coleção do Le Spiritisme original em francês - Encyclopédie Spirite
  • 1ª edição de O Espiritismo (Le Spiritisme), tradução de Rogério Miguez - Ler online.
  • Coleção do Bulletin de l'Union Spirite Française e do Survive, periódicos da UEF - ebook (acesso em novembro, 2020).
  • Fanpage Imagens e registros históricos do Espiritismo do CSI do Espiritismo no Facebook (acesso em novembro, 2020).
  • Museu Virtual do Espiritismo no site Allan Kardec Online (acesso em novembro, 2020).


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Índice de verbetes
A Gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo
Abreu, Canuto
Adolphe Laurent de Faget
Agênere
Alexandre Aksakof
Allan Kardec
Alma
Alma gêmea
Amélie Gabrielle Boudet
Amuleto
Anália Franco
Anastasio García López
Andrew Jackson Davis
Anna Blackwell
Arigó, Zé
Arthur Conan Doyle
Auto de Fé de Barcelona
Auto-obsessão.
Banner of Light
Baudin, Irmãs
Bem
Berthe Fropo
Blackwell, Anna
Boudet, Amélie Gabrielle
Cairbar Schutel
Canuto Abreu
Caridade
Carma
Caroline Baudin
Célina Japhet
Cepa Espírita
Charlatanismo
Charlatão
Chevreuil, Léon
Chico Xavier
Cirne, Leopoldo
Codificador Espírita
Comunicabilidade Espiritual
Conan Doyle, Arthur
Consolador
Cordão de Prata
Cordão Fluídico
Crookes, William
Daniel Dunglas Home
Davis, Andrew Jackson
Denis, Léon
Dentu, Editora
Dentu, Édouard
Desencarnado
Deus
Didier, Pierre-Paul
Divaldo Pereira Franco
Dogma
Dogmatismo
Doutrina Espírita
Doyle, Arthur Conan
Dufaux, Ermance
Ectoplasma
Ectoplasmia
Ecumenismo
Editora Dentu
Édouard Dentu
Elementos Gerais do Universo
Emancipação da Alma
Encarnado
Epífise
Erasto
Ermance Dufaux
Errante
Erraticidade
Errático
Escala Espírita
Escrita Direta
Espiritismo
Espiritismo à Francesa: a derrocada do movimento espírita francês pós-Kardec
Espírito da Verdade
Espírito de Verdade
Espírito Santo
Espírito Verdade
Espiritual
Espiritualidade
Espiritualismo
Espiritualismo Moderno
Evangelho
Expiação
Faget, Laurent de
Fascinação
Fio de Prata
Fluido
Fora da Caridade não há salvação
Fox, Irmãs
Francisco Cândido Xavier
Franco, Anália
Franco, Divaldo
Fropo, Berthe
Galeria d’Orleans
Gama, Zilda
Glândula Pineal
Henri Sausse
Herculano Pires, José
Herege
Heresia
Hippolyte-Léon Denizard Rivail
Home, Daniel Dunglas
Humberto de Campos
Imortalidade da Alma
Inquisição
Irmão X
Irmãs Baudin
Irmãs Fox
Jackson Davis, Andrew
Japhet, Célina
Jean Meyer
Jean-Baptiste Roustaing
Joanna de Ângelis
Johann Heinrich Pestalozzi
José Arigó
José Herculano Pires
José Pedro de Freitas (Zé Arigó)
Julie Baudin
Kardec, Allan
Kardecismo
Kardecista
Kardequiano
Karma
Lachâtre, Maurice
Lacordaire
Lamennais
Laurent de Faget
Léon Chevreuil
Léon Denis
Leopoldo Cirne
Leymarie, Pierre-Gaëtan
Linda Gazzera
Livraria Dentu
London Dialectical Society
Madame Kardec
Mal
Maurice Lachâtre
Mediatriz
Médium
Mediunidade
Mediunismo
Mesas Girantes
Metempsicose
Meyer, Jean
Misticismo
Místico
Moderno Espiritualismo
Necromancia
O Livro dos Espíritos
O Livro dos Médiuns
Obras Básicas do Espiritismo
Obsediado
Obsessão
Obsessor
Onipresença
Oração
Palais-Royal
Panteísmo
Paráclito
Parasitismo psíquico
Pélagie Baudin
Percepção extrassensorial
Pereira, Yvonne A.
Perispírito
Pestalozzi, Johann Heinrich
Pierre-Gaëtan Leymarie
Pierre-Paul Didier
Pineal
Pires, José Herculano
Pneumatografia
Possessão
Prece
Pressentimento
Projeto Allan Kardec
Quiromancia
Religião
Revelação Espírita
Rivail, Hypolite-Léon Denizard
Roustaing, Jean-Baptiste
Santíssima Trindade
Santo Ofício
Sausse, Henri
Schutel, Cairbar
Sematologia
Sentido Espiritual
Sexto Sentido
Silvino Canuto Abreu
Sociedade Dialética de Londres
Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas
SPEE
Subjugação
Superstição
Talismã
Terceira Revelação
Tiptologia
Tribunal do Santo Ofício
Trindade Universal
Ubiquidade
UEF
União Espírita Francesa
Vampirismo
Verdade, Espírito
Videira Espírita
William Crookes
X, Irmão
Xavier, Chico
Xenoglossia
Yvonne A. Pereira
Zé Arigó
Zilda Gama

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