Yvonne do Amaral Pereira (Rio das Flores, RJ, 24 de dezembro de 1900 - Rio de Janeiro, 9 de março de 1984) foi uma notável médium espírita de grandes recursos mediúnicos, dentre os quais o de psicógrafa, autora de importantes livros doutrinários, tais como os clássicos: Memórias de um Suicida, ditado pelo Espírito Camilo Cândido Botelho e Ressurreição e Vida, pelo Espírito Leon Tolstoi. Fiel aos conceitos kardecistas, ela dedicou parte de sua vida, além da obra literária, ao trabalho de socorro espiritual e receituário homeopático. Figura-se entre os nomes mais respeitados da mediunidade no Brasil.
Yvonne A. Pereira nasceu na antiga Vila de Santa Tereza de Valença, hoje Rio das Flores, sul do estado do Rio de Janeiro, filha de Manoel José Pereira Filho, um pequeno negociante, e mãe Elizabeth do Amaral Pereira, doméstica. Teve 5 irmãos mais moços e um mais velho (este último, filho do primeiro casamento da mãe).
Aos 29 dias de nascida, depois de um acesso de tosse, ela foi acometida de uma sufocação que a deixou em estado de catalepsia, permanecendo assim por 6 horas e tivesse atestada a sua morte. Já com os preparativos para o sepultamento em andamento, a recém-nascida desperta aos prantos, porém revigorada.
Sobre esse drama, Yvonne — depois de já ambientada com as suas tarefas mediúnicas — revelou tratar-se de um reflexo espiritual, fruto de um dos muitos complexos que carregava ao longo de seu curso reencarnatório, especialmente pela ocorrência, em sua reencarnação precedente, da sua morte por afogamento, num ato de suicídio. À sua pronta recuperação, ela também creditou os méritos da prece sincera e fervorosa de sua mãe, movida por uma intuição de que sua filha não estivesse morte, dirigindo-se a Maria de Nazaré.
Seu berço era um lar honrado. O pai, generoso de coração, desinteressado dos bens materiais, entrou em falência por três vezes, pois favorecia os fregueses em prejuízo próprio. Mais tarde, tornou-se funcionário público, cargo que ocupou até sua desencarnação, em 1935. O lar sempre foi pobre o modesto, conheceu dificuldades inerentes ao seu estado social, o que, segundo ela, a beneficiou muito, pois bem cedo se desiludiu das vaidades mundanas e compreendeu as necessidades do próximo. O exemplo de conduta dos pais teve influência capital no futuro comportamento da médium. Era comum albergar na casa pessoas necessitadas e mendigos.
Suas capacidades mediúnicas brotaram muito cedo. Aos 4 anos já via, ouvia e se comunicava com os Espíritos com uma naturalidade de quem falasse com encarnados. Dentre seus interlocutores do além, duas entidades eram particularmente caras: O Espírito Charles, a quem considerava pai real (devido a vívidas lembranças de uma encarnação passada, quando este havia sido seu pai carnal de fato); e o Espírito que se apresentava como Roberto de Canalejas (que havia sido um médico espanhol, em meados do século XIX, e com quem também tivera ligações pessoais de longa data).
Charles, que Yvonne reconhecia ser um Espírito elevado, foi seu orientador durante toda a sua vida e seu especial amparador durante as atividades mediúnicas.
Mais tarde, na vida adulta, a médium manteria contatos mediúnicos regulares com outras entidades igualmente consideráveis, tais como Dr. Bezerra de Menezes, Camilo Castelo Branco, Frederic Chopin e Leon Tolstoi. Estes se serviram da psicografia da devotada espírita na produção de relevantes obras literárias para o Espiritismo.
O fenômeno de catalepsia repetiu-se quando Yvonne tinha ainda 8 anos de idade, levando-a a um desprendimento parcial, durante o qual, conta ela, vivenciou uma experiência que a marcou pelo resto da vida. Em desdobramento espiritual e em profundo estado de agonia, foi parar ante uma imagem do "Senhor dos Passos", a quem implorava socorro. A imagem, então, dirigiu-lhe as seguintes palavras: "Vem comigo minha filha, será o único recurso que terás para suportar os sofrimentos que te esperam". Ela aceitou a mão que lhe era estendida, subiu os degraus e não se lembra de mais nada.
De fato, Yvonne Pereira foi uma criança infeliz, acossada por uma imensa saudade do ambiente familiar que tivera na sua última encarnação, na Espanha, que ela lembrava com extraordinária clareza. Considerava seus atuais familiares como estranhos, principalmente seu pai e irmãos. Em seu estado de espírito, o pai verdadeiro era o espírito Charles e a casa, a da Espanha. Esses sentimentos desencontrados e o afloramento das faculdades mediúnicas faziam com que tivesse comportamento considerado anormal por seus familiares. Por esse motivo, até os dez anos, passou a maior parte do tempo na casa da avó paterna.
A problemática mediúnica da pequena Yvonne levou sua família a buscar instrução espírita. Teve os primeiros contatos com livros do gênero logo após a segunda catalepsia. Ela conservou a forte e positiva impressão que teve quando, aos doze anos de idade, seu pai lhe presenteou O Evangelho segundo o Espiritismo e O Livro dos Espíritos (ambos de Allan Kardec) — obras de cabeceira, que a acompanharam pelo resto da vida, sendo a sua leitura repetida e um bálsamo nas horas mais difíceis.
A leitura espírita despertou em Yvonne o gosto pela literatura e pelo estudo em geral. Porém, como instrução escolar, não foi além do curso primário, por falta de condições econômicas — o que lhe representou uma grande provação. Também cedo começou a trabalhar para auxiliar o orçamento da família, ocupando-se de costura, bordado, rendas, flores e afazeres domésticos. Além disso, a rígida educação patriarcal que recebeu fez com que vivesse reclusa no ambiente doméstico. Isto, por um lado, favoreceu o desenvolvimento e recolhimento mediúnico, mas por outro, a tornou excessivamente tímida e triste.
Aos 13 anos começou a frequentar as sessões práticas de Espiritismo, que muito a encantavam, pois via os Espíritos comunicantes. Os desdobramentos espirituais se intensificaram a partir dos seus 16 anos, desenvolvendo-se ao lado de outras faculdades mediúnicas, inclusive a de efeitos físicos, por exemplo, materializações espirituais.
Essas aptidões, somadas ao amparo dos benfeitores do além e de sua disposição moral, credenciaram Yvonne para o cumprimento de um grande serviço mediúnico espírita, com mais de meio século de dedicação, junto a casas espíritas por onde passou (Lavras, MG; Barra do Pirai, RJ; Juiz de Fora, MG; Rio de Janeiro e Pedro Leopoldo, MG, ao lado do seu amigo Chico Xavier), sempre com caridade, conforme o preceito espírita da mediunidade gratuita e desinteressada.
Assistida por entidades de grande elevação, como Bezerra de Menezes, Charles, Roberto de Canalejas e Bittencourt Sampaio, foi receitista de tratamento homeopático e passista.
No campo da mediunidade, dizia que o trabalho que mais gostava de fazer era aquele comumente chamado de desobsessão, como médium psicofônica, entrando em contato e prestando atendimento a Espíritos sofredores, obsessores e obsidiados — com dedicação especial aos suicidas (em função de seu drama pessoal).
Espiritista convicta, Yvonne foi ainda uma grande propagandista da obra de Kardec, atuando em eventos públicos, palestrando, concedendo entrevista à mídia, escrevendo artigos e livros próprios, narrando suas experiências pessoais com a mediunidade e dissertando sobre conceitos doutrinários.
Como médium psicógrafa, contribuiu para a literatura espírita publicando obras de renomadas entidades espirituais, tais como Leon Tolstoi, Camilo Castelo Branco (pelo pseudônimo Camilo Cândido Botelho), Léon Denis, Bezerra de Menezes e Charles (seu principal mentor espiritual).
Yvonne começou a escrever os ditados espirituais quando ainda era jovem, porém sem revelar tal acervo ao público até que, por insistência dos Espíritos e pela chancela de Chico Xavier, ela submeteu os textos à Federação Espírita Brasileira, que então cuidou de fazer a publicação das obras, dentre as quais destacamos:
De sua própria lavra, publicou duas obras de grande sucesso no meio espírita, especialmente para apreciação da mediunidade:
Postumamente, seus escritos pessoais têm sido recuperados e transformados em obras, por exemplo:
Toda renda de sua obra literária foi voluntariamente destinada à FEB.
Yvonne partiu para a pátria espiritual em 9 de março de 1984, quando se submetera a uma cirurgia de colocação de um marca-passo, deixando um legado inestimável e gravando seu nome no rol dos mais respeitáveis médiuns espíritas de todos os tempos.
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